quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Capítulo I - Por las calles desconocidas (parte 3)

Triunfo da Morte. Peter Bruegel

Parte 03 - Paradiso*

A experiência angustiante de ser eu mesmo nesse momento tão desafiador poderia se passar sem que eu precisasse, necessariamente, sofrer as agruras de ter de conviver com as lembranças do que um dia eu fui. Agora, miseravelmente, me encontro num paraíso às avessas onde a dor deve ser descrita como o menor dos males, e que bom seria se fosse possível ser apenas a dor, sentir, sofrer, a dor... Aqui vista como uma vivência aliviante, aconchegante.

- Quem está aí?
- Eu serei aquilo que seu passado de fracassos poderia apenas timidamente desejar... - uma voz sombria e gutural, aos berros, responde minha pergunta, enquanto eu, imóvel, cego, destruído, tento passar despercebido por essa corporalidade mortificante. Um vento gelado passa por todas as minhas vértebras, pelo meu ser, como se estivesse numa gaveta mortuária, um corpo aguardando sua autópsia, gélido, cadavérico, marmorizado, inabalável. As estruturas do meu já fragilizado ser podem não mais aguentar tanta pressão.

E aquela figura? O que seria aquilo que está se aproximando vagarosamente de mim, como uma locomotiva em rota de colisão direta? Seria o início de um pesadelo pervertido, maquinado por um arquiteto insano, que reconhece em mim todas as mazelas que precisam ser sofridas por aqueles que se ausentam de seus deveres primordiais. Questiono-me, pela primeira vez, qual seria o verdadeiro significado disto tudo. Qual seria o real propósito dessa viagem macabra por esse paraíso de almas perdidas...

*Paraíso

CONTINUA...

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Capítulo I - Por las calles desconocidas (parte 2)



Parte 2 - No Way*

"O que aconteceu? Como vim parar aqui? Que lugar é esse tão sombrio, tão assustador? [...] Que lugar é esse? Infinito, vazio... Sou eu, infinitude, vazio, está dentro de mim... Quem sou eu? O que aconteceu? Onde estou? No meu próprio inferno, andando por ruas desconhecidas...".  Continuo na minha odisseia, andando sem saber em direção a quê. Já começo a acostumar com a penumbra e parece que, a todo tempo, percebo vultos que perseguem a minha histeria, os ruídos se transformaram em gritos agudos que ferem meus ouvidos como se agulhas fossem enfiadas periodicamente, concomitantemente, dolorosamente... Meus sentidos já não respondem minhas ordens, ando sem rumo, arrasto-me pelos caminhos gelados e tortuosos que minha própria alma me impõe, tudo parece mais aterrorizante... Alguma coisa me tocou? O que será? A sensação do toque alivia meu sofrimento, pareço ter chegado em algum lugar, alguma materialidade que corresponde a estar no caminho (certo?). Minha pele, antes desacostumada ao toque, pela aventura que aqui vos digo, arrepia-se com essa nova possibilidade...

Que sensação nova é essa? Essa segurança que toma meus pés, minhas pernas, me puxando... SOCORRO! Essa coisa está se apoderando de mim, estou caindo no fundo, sem fundo, de uma experiência ameaçadora, nova, desconhecida (e como todo desconhecido, inaceitável). Grito com toda minha força, a sensação, antes reconfortante, ganha ares de uma tortura, garras apertam meu corpo como se amassando um copo descartável em uma brincadeira sádica. Meus ossos estalam sufocados pela força descomunal, impactados, compactados... Tento livrar-me do meu algoz, quanto mais tento, mais preso, mais dor, desmaio... Sem outras opções, sem caminho, deixo meu corpo.

*Sem caminho

CONTINUA...